12.4.06

Tempos amenos


Uma pessoa leva uma vida de cão, sempre a pensar nos almoços, nos jantares, nas contas, no frigorífico avariado, nos vidros sujos, e muitas vezes nem tem olhos para ver os outros. Eu gosto de estar à janela, ouvir as vozes cá em baixo, imaginar aquelas vidas, maldizer o palerma que humilha mulher, sossegar a adolescente inquieta, ajudar a velhinha a subir, criticar a esposa distante e fazer uma carícia no cabelo das crianças.
Gosto de estar à janela com o homem que amo porque as nossas vozes não se ouvem para dentro nem se escutam em baixo. Mas o que gosto mais, é estar perto dele, com os ombros encostados e os dois a observar as mesmas coisas.Temos o mesmo norte, o mesmo sul, as mesmas árvores a oriente e os mesmos vultos a ocidente.
Sussuramos as palavras para o vento as levar de mansinho e ali ficamos até as vozes de dentro chamarem e as de fora nos cansarem.
Também por isso gosto da Primavera. Se nos quiserem ver, olhem para cima. Lá estamos de novo os dois.

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