29.5.06

Sabes

O mundo pula e avança, já dizia o poeta, e é mesmo assim. Pula e avança, como um gato num telhado a ser passeado por um vulto que não se percebe se é homem se mulher. Viram os dias e chegam aqueles em que já não é noite a essa hora e o vulto se transforma numa mulher - é mulher afinal, um inverno inteiro sem se perceber. Os cães continuam a ser passeados à mesma hora mais tardia, os mesmos cães, a mesma hora, mas em dias que acabam mais tarde: não é tão noite, por assim dizer, relativa ao dia que terminou, embora cães e gatos mantenham os mesmos horários. É nessas rotinas que parecem iguais, é nas trepadeiras que parecem não ter crescido mas caem agora dos pauzinhos onde estavam presas, é nessa indiferença absoluta do mundo, que teima em pular e avançar ao tempo de uma planta a crescer, essa que observamos e se mantem imóvel e, quando nos voltamos, já foge do vaso pelas paredes acima, é essa indiferença dinâmica que o mundo teima em manter, em não nos ligar nenhuma (a nós e às nossas angústias e ritmos e dias assim e outro menos assim) e, ao mesmo tempo, em andar para a frente e nos empurrar, quer queiramos quer não, é essa força brutal que nos obriga, passe o lugar comum, a - tão simples quanto isto - viver.

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