Sinceramente
A sério, não sei porque me fui embora naquele dia. Só sei que não foi pelo que pensas, tu não fizeste nada errado, não és tu, sou eu.
Sou eu que não sou normal, é em mim que (de certeza, certezinha) alguma coisa morreu, que não sou capaz de sentir, que penso demais, que não sei acordar ao lado de alguém sem querer fugir, não, está tudo errado, acidez no estômago, margo na boca, as entranhas às voltas, e só me apetece sair dali, vestir-me depressa e sair porta fora, não obrigada, nunca tomo pequeno almoço, estou com pressa, um compromisso (mas porque diabo não saí a meio da noite, porque diabo me deixei dormir), até logo.
Às vezes ainda é pior, começo a sentir um sabor a cinzas assim que o meu corpo é tocado por outro, o sexo sabe a funeral, como se estivesse a enterrar logo ali uma relação que ainda nem nasceu, a ansiedade aperta-me, custa-me respirar, e só quero que acabe, depressa, depressa, preciso de sair e respirar outra vez.
Juro-te que pensei que contigo ia ser diferente, juro que é verdade, não te quis magoar, não me quis magoar a mim, não penses que isto não me dói também, não penses que eu percebo o que se passa, que o posso controlar. Juro-te que pensei que estava mesmo apaixonada por ti, pensei mesmo, no caminho, enquanto guiava ao teu encontro, o vento na janela, e ao jantar, antes de me tocares , enquanto o sangue me corria nas veias espesso escuro e quente, tão quente que me fundia, o meu corpo todo a perder a forma até se tornar um único ponto incandescente.
E juro-te que tentei, na manhã seguinte, tentei acalmar a ansiedade, afogá-la no duche, e fomos almoçar, almocei contigo, e conversámos, e tentei ser normal, mas não aguentei, desculpa, quando saímos e olhaste para mim com uma interrogação no olhar, não consegui, desculpa, tive de te dizer que me ia embora. E disse-o muito depressa, para não te dar tempo de reagir, para não ver a tua reacção, evitei-te o olhar com afinco, lembro-me de te ver pelo espelho retrovisor, de mãos nos bolsos no meio da rua.
E só me senti voltar à vida já longe, na estrada curvilínea junto ao mar, com o vento e a maresia na cara e os pingos da chuva morninha que começou a cair, só aí consegui respirar. O mal estar continuou, claro, sou uma cabra, e a dor, porque acho mesmo que estava apaixonada por ti, juro, mas não importa, a isso já estou habituada, e já consigo respirar outra vez, em grandes golfadas de ar, sôfrega por ter quase asfixiado.
Mas não és tu, tu fizeste tudo bem, por favor não fiques a pensar que a culpa é tua. Prefiro que me chames nomes, prefiro que me odeies, do que saber que te sentes mal contigo próprio por minha causa.
E era isto que eu te diria, sinceramente, se alguma vez me tivesses perguntado.
Sou eu que não sou normal, é em mim que (de certeza, certezinha) alguma coisa morreu, que não sou capaz de sentir, que penso demais, que não sei acordar ao lado de alguém sem querer fugir, não, está tudo errado, acidez no estômago, margo na boca, as entranhas às voltas, e só me apetece sair dali, vestir-me depressa e sair porta fora, não obrigada, nunca tomo pequeno almoço, estou com pressa, um compromisso (mas porque diabo não saí a meio da noite, porque diabo me deixei dormir), até logo.
Às vezes ainda é pior, começo a sentir um sabor a cinzas assim que o meu corpo é tocado por outro, o sexo sabe a funeral, como se estivesse a enterrar logo ali uma relação que ainda nem nasceu, a ansiedade aperta-me, custa-me respirar, e só quero que acabe, depressa, depressa, preciso de sair e respirar outra vez.
Juro-te que pensei que contigo ia ser diferente, juro que é verdade, não te quis magoar, não me quis magoar a mim, não penses que isto não me dói também, não penses que eu percebo o que se passa, que o posso controlar. Juro-te que pensei que estava mesmo apaixonada por ti, pensei mesmo, no caminho, enquanto guiava ao teu encontro, o vento na janela, e ao jantar, antes de me tocares , enquanto o sangue me corria nas veias espesso escuro e quente, tão quente que me fundia, o meu corpo todo a perder a forma até se tornar um único ponto incandescente.
E juro-te que tentei, na manhã seguinte, tentei acalmar a ansiedade, afogá-la no duche, e fomos almoçar, almocei contigo, e conversámos, e tentei ser normal, mas não aguentei, desculpa, quando saímos e olhaste para mim com uma interrogação no olhar, não consegui, desculpa, tive de te dizer que me ia embora. E disse-o muito depressa, para não te dar tempo de reagir, para não ver a tua reacção, evitei-te o olhar com afinco, lembro-me de te ver pelo espelho retrovisor, de mãos nos bolsos no meio da rua.
E só me senti voltar à vida já longe, na estrada curvilínea junto ao mar, com o vento e a maresia na cara e os pingos da chuva morninha que começou a cair, só aí consegui respirar. O mal estar continuou, claro, sou uma cabra, e a dor, porque acho mesmo que estava apaixonada por ti, juro, mas não importa, a isso já estou habituada, e já consigo respirar outra vez, em grandes golfadas de ar, sôfrega por ter quase asfixiado.
Mas não és tu, tu fizeste tudo bem, por favor não fiques a pensar que a culpa é tua. Prefiro que me chames nomes, prefiro que me odeies, do que saber que te sentes mal contigo próprio por minha causa.
E era isto que eu te diria, sinceramente, se alguma vez me tivesses perguntado.
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