17.10.05

Peer-Pressure

O desenvolvimento dos nosso filhos é uma coisa estranha, pelo menos para mim. Pela primeira vez vejo-me realmente a combater guerras que não minhas e a sentir a pressão dos colegas nos meus filhos.
Posto tudo numa balança, de um lado tenho aquilo que fui quando criança, aquilo que aprendi enquanto a mesma criança e, aquilo que aprendi já depois de adulta a aolhar para trás; do outro, só tenho um olhar interrogativo, uma expressão de desorientação e uma escolha apressada, muitas vezes feita por outros que não os donos daquela expressão.

Sei bem que a aprendizagem se faz, na maioria dos casos por imitação, que é a pressão dos pares sobre as crianças (e também sobre todos os outros em geral) que as leva a experimentar coisas novas, que as desperta para novos sentidos, novas noções, que no fundo lhes dá as preferências, os gostos e, atrevo-me até a dizer, as inclinações futuras.
Sei também, que aquilo que é genético, que o feitio próprio de cada uma, que a educação e o contacto têm, é claro, uma grande percentagem no seu desenvolvimento mas, pensando bem, se repartir o dia dos meus filhos, o tempo que tenho para estar com eles é irrelevante contra o mundo fantástico que existe lá fora e que está por conhecer.

Hoje a minha filha decidiu que queria passar a ver os Morangos com Açucar, coisa que já tinha experimentado fazer o ano passado mas não tinha gostado, só que desta vez a coisa foi séria e, porquê? Porque é gozada na escola por ser a única que não conhece a história.
Quando me comunicou tal intenção, alegando fazer os trabalhos de casa todos antes do começo da novela, perguntei-lhe porque o fazia, já que uma vez tinha visto e não tinha achado piada. A resposta foi simples:
-Sou a única na escola que não vejo, não tenho o que falar com as minhas amigas.

A primeira coisa que uma pessoa sente, é logo uma embirração por todas as ditas amigas e a sua “estupidez de criança” em relação à diferença; depois vem-nos à ideia que lá se foram as leituras, os jogos e a brincadeira que ajuda a desenvolver nos moldes que eu mais gostaria que acontecesse, em seguida, sente-se a dificuldade que a miúda tem em se relacionar com os outros, só porque não conhece, não vê ou não tem acesso a alguma coisa, o esforço que ela quer fazer para se integrar.

Lembro-me de ler a Mafalda e achar que o facto de ela não ter televisão era a pior coisa do mundo, que ser diferente não era bom, lembro-me da vontade que tinha em ter amigos, não ser gozada por não ter isto ou aquilo, lembro-me de ver as novelas que achava uma estucha mas, via porque todos viam, lembro-me de não querer estar sozinha no pátio da escola ao intervalo, de ver as outras brincarem longe com aqueles sorrisinhos meio tolos e de pensar que queria ser igual.
Não me lembro da minha mãe me ter dito que alguma vez sentiu o mesmo.

Abro lentamente a mão dos meus filhos, pois não lhes conheço a realidade, não lhe sei medir a importância, nem sei combater por eles, apenas lhes dou o que lhes posso dar, salvaguardando no tempo em que estou com eles, a ideia que um dia irão querer ser diferentes de todos os outros mas, isso, bem sei, é apenas depois de se terem sentido iguais.
Penso, entretanto, o quanto abri de mim para e pelos outros e, o quanto isso me fez ser absolutamente eu.


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