24.7.06

O caso do sapato de salto agulha

Olha agora que estou no meu intervalo pus-me aqui a pensar nos vários usos que se podem dar aos saltos agulha de certos tipos de sapatos e realmente e desculpe lá que lhe diga caro pirata vermelho mas sapato de salto agulha não é sapato de puta. Não que eu seja uma, acho que já deixei aqui bem claro que não sou uma profissional do sexo mas sim uma artista, mas conheço muitas que infelizmente tiveram que enveredar por essa via por falta de talento e por necessidades financeiras muito graves e preocupantes e de certeza que o meu caro amigo nunca se deu ao trabalho de conversar com nenhuma para perceber a problemática dessa profissão extraordinariamente difícil. Se tivesse por acaso conversado com alguma e se tivessem debruçado sobre o assunto do calçado mais conveniente pois ela com certeza lhe diria que a maioria das putas gostam de usar calçado confortável, sobretudo as do género puta de esquina ou puta de estrada. Quando muito aventuram-se aos sapatos de salto maçaneta ou montanha. Pelo menos no nosso país porque ver eu até já vi putas com sapatos de salto agulha mas foi em montras com luzes vermelhas por trás. Essas como estão sentadinhas ali toda a noite (e algumas todo o dia também) à espera dos clientes e como não precisam de ir andando por aí à procura dos melhores poisos de clientes à rasquinha, essas pois podem usar o calçado que mais lhes convier claro está.

Mas como no nosso país não há montras vermelhas com putas lá dentro, eu lhe garanto que aqui dificilmente encontrará alguma usando sapatos de salto agulha. Este género de calçado é muito estimado no meio artístico mas digo-lhe já que dançar com este tipo de sapato não é para qualquer uma. Requer um equilíbrio desumano e muitas e muitas horas de treino até que nos sintamos totalmente à vontade assentes sobre duas pequenas terminações que não tem mais de 1 cm cada uma. Se não me acredita experimente e logo verá. Enfim, talvez seja difícil arranjar um par que lhe sirva mas então peço-lhe que reflicta um pouco antes de maldizer tal calçado e rotulá-lo como sapato de puta que é coisa que ele sinceramente não é.

E dos usos que já dei aos saltos agulha dos meus preciosos sapatos, para além dos que deve ter imaginado e esses eu também posso ter imaginado mas garanto-lhe que com eles nunca furei nenhum olho a ninguém por muita vontade que tivesse tido de o fazer em certas situações, pois aqui lhe deixo um pequeno caso para ver a multiplicidade de usos que se podem dar aos saltos dos sapatos em querendo. E talvez lhe faça pensar duas vezes na dignidade deste tipo de calçado que foi por si tão menosprezado.

Aqui há uns meses atrás fizemos aqui no Amarguinha a festa de despedida de solteiro do filho do presidente da junta. Aquilo começou logo mal de início porque a noiva também queria fazer a festa de despedida dela ali e por muito que nós lhe explicássemos que os homens tinham prevalência e não é por nada que nós não descriminamos ninguém mas é só porque os homens no geral são mais generosos do que as mulheres e as gorjetas com eles são sempre cinco ou seis vezes mais do que com elas, já para não dizer que há mulheres que nem gorjeta sequer deixam. E depois não sei porquê mas os preparativos engataram-se todos um bocado. As meninas não atinavam com as músicas e os rapazes estavam mais desordeiros do que é costume. Refilavam com a mesa e com a vista que estavam muito longe e não viam bem o espectáculo. Queriam meninas a servi-los e nesse dia o Jacinto tinha pedido ajuda a dois sobrinhos para conseguir dar conta do recado. Depois o gelo foi-se a meio da festa porque o gerador do frigorífico pifou e o rapaz já ameaçava ligar ao pai para nos mandar cancelar a licença e eu então resolvi que o melhor era trazer os rapazes para a festa connosco antes que a coisa desse pró torto. Fomos buscar a máquina de karaoke que o Jacinto tinha comprado que este homem está sempre a gastar dinheiro em coisas que não deve mas é mais forte do que ele, apesar de tal coisa ainda não ter sido usada porque ali no Clube não há cá truques desse género que a voz que se houve nos espectáculos é mesmo a das artistas que lá estão em palco.

Ao ligar a máquina pois percebemos que faltava ali uma peça que aqui vai ter que me perdoar a minha ignorância tenalógica mas era qualquer coisa que regulava os trifásicos da máquina e sem aquilo pois que a dita coisa não funcionava nem por nada. Era preciso qualquer coisa estreita e comprida para pôr lá no lugar da peça que faltava e veja bem que sim, foi um salto agulha de um sapato azul marinho com reflexos carmim que salvou a noite nesse dia. Eu é que não percebo muito disto senão até lhe mostrava aqui uma fotografia para ver como a bendita máquina para além de ficar a funcionar ficou também muito mais bonita e charmosa. E assim cantámos e dançamos com eles toda a noite à conta do meu providencial sapato portanto como vê há sempre mais para além do que se avista num sapato de salto agulha.

Sem mais outro assunto me despeço e lhe lanço aqui um apelo à imaginação caro amigo. Nós podemos criticar as coisas por serem apenas meras e vulgares coisas. Podemos ignorá-las e desprezá-las. Mas tudo tem o seu valor se você souber como valorizá-las. Se estou a parecer-lhe condescendente pois peço-lhe perdão. A minha intenção é apenas tentar abrir-lhe os horizontes e não fechá-los. Só lá, na mente, conseguimos depois voar para longe do cinzentismo que é a vida do cidadão comum. Mas tenho a certeza que sabe disso tão bem ou melhor do que eu.

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