16.9.06

Fazer-se notar

A única coisa que retive das muitas que a minha mãezinha me disse ao longo de toda a sua felizmente curta vida, e não estou a ser mazinha é mesmo porque a mulher levou uma vida desgraçada e cheia de sofrimento, pois a única coisa que me ficou dela foi esta clara indicação de que se a gente não se fizesse notar estávamos lixados. Claro que ela acrescentava sempre que havíamos de nos fazer notar no bom sentido e não creio que as posições por vezes horizontais que assumimos no triste espectáculo que é a vida coubessem estritamente nesse acrescento. Cada um faz-se notar com o que pode, acho que é mais isso. Há que fazer um grande chinfrim. Disso não tenho dúvidas nenhumas! Se a gente não gritar mais alto do que o resto do maralhal é difícil chegar a algum lado quando há por aí tanta boquinha para alimentar. E neste mundo cão cheio de gente por todos os lados, sermos passivos, diria mesmo bem comportadinhos, não serve. Ninguém repara em nós se não formos muito chatinhos!

Claro que há maneiras e maneiras de chatear meio mundo e o outro. Podemos ser agressivos q.b. e despertar uma enorme e gigantesca onda de ódio e repulsa em quem nos atura, mas aí é bom termos muito poder ou muito dinheiro para que não nos interesse minimamente se o pessoal está ou não bem ao pé da gente. Desde que nos obedeçam claro! E já agora que sejam subservientes também!

Depois há os que não tem dinheiro nem poder e nem sequer gostam de ser sádicos, que isto de pisar os calos tem que se lhe diga e nem todos o fazem conscientemente, e que querem ser notados pela sua arte. Arte essa que pode incluir qualquer coisa desde saber pintar, escrever, cantar ou até vestir! Qualquer coisa que cause um impacto em quem nos vê, ou nos lê, e que fique interessado ou pelo menos curioso em saber quem está por trás dessa imagem que lhes é apelativa. E agora é aqui que a porca torce o rabo porque isto do apelativo tem muito que se lhe diga. Jogar com a imagem é do mais fácil que há, embora seja do mais injusto também pois nem toda a gente nasce igual à Brigitte Bardot nem ao Brad Pitt. Mas quem tem dois palminhos de cara já é meio caminho andado para se fazer notar. Pura sorte para eles e pura injustiça para o resto de nós que temos que recorrer a outras formas de nos fazermos notar!

Não tendo dois palminhos de cara e nenhum jeito óbvio para pintar, dançar, esculpir ou cantar porque por aí também serviria, temos que nos agarrar a esta arte ingrata e inglória que é a escrita. Há mil maneiras de se dizer qualquer coisa. Há milhões de palavras e uma multiplicidade de línguas tal que acho mesmo que ninguém sabe quantas serão de facto! E nós brutos que somos pegamos numas quantas e tentamos juntá-las de forma a causar um impacto em quem está do outro lado. Não é fácil. A maior parte dos textos, livros, artigos, etc aborrecem-nos até à morte! Ou porque não percebemos do que raio está o autor a falar. Ou porque estamos totalmente fora do contexto e tudo aquilo nos passa completamente ao lado. Ou porque o texto em si presta-se a várias interpretações e nenhuma delas nos interessa minimamente. Na realidade qualquer coisa que se escreva sobre política, história, religião, valores e costumes, futebol e carros e por aí fora é tremendamente chato para quem não se interessa por nenhum desses temas! E nem me a atrevo a acrescentar mais alguns com medo de levar mais umas quantas pedradas que eu escrevo porque sou masoquista mas nem por isso gosto de me fazer notar no mau sentido!

Eu sei que há formas e maneiras e nem toda a gente tem sequer capacidade para despejar o que lhe vai na alma para o papel, ainda que virtual. Isto claro para quem traz algo em si que necessita partilhar o que nem sempre é o caso! Se retirarmos temas óbvios que são de interesse generalizado como o tempo que irá fazer amanhã porque se chover é sempre mau excepto para quem anda na agricultura mas nesse caso não terão tempo nem paciência para pensar em temas para encher posts num blog; as quecas que deram os vizinhos da frente preferencialmente se os dois andam desencontrados e andam a esconder amantes e namorados um do outro que aquilo é uma escandaleira que só visto; o dinheiro que ganhámos no euromilhões e o que faríamos com o resto que ficou para um cabrão dum gajo qualquer que nos dava muito mais jeito a nós; os filhos dos outros que são muito mais engraçados, espertos e atinados que os nossos que estes se fossem abandonados não haveria família ou lar que lhes pegasse de tão diabólicos que são; sexo muito sexo que faz sempre falta mas ninguém se acusa para não dar mau aspecto excepto os homens que dizem sempre que fazem muito e se as mulheres se põem com ar de santas a dizer que não é nada com elas ou os gajos andam a mentir ou vão todos às putas ou andam mas é a brincar uns com os outros; o amor às vezes também serve mas já ninguém tem muita pachorra para as lamechices que já passaram de moda até porque é a tal história das promessas de vidro e a gente já está um bocado decepcionada com a facilidade com que elas se partem; e a bem dizer encontrar-se qualquer baboseira para se escrever encontra-se sempre.

Mas fazê-lo com gosto, empenho, inspiração e arte… de modo a fazer-se notar por aquilo que aqui se consegue ou não transmitir, isso é que já é uma outra história completamente diferente. Hoje em dia ninguém se pode queixar de falta de tempo de antena! Portanto isto é como o tiro aos pardais. A gente manda muitos tiros mas nem sempre acerta. E estes posts acabam por ser como tiros desperdiçados e de destino incerto. Mas eu como sou casmurra e masoquista e ando há procura dum objectivo claro e definido para esta porra de vida, objectivo esse que tarda em chegar mas também estou em crer que nem me aperceberia dele se me caísse em cima dos cornos envolto numa chuva de pedregulhos… pois como ia dizendo, à falta de um objectivo claro e definido tento ávida e desesperadamente fazer-me notar! Mas é mesmo só para agradar à minha querida mãezinha que já foi desta para pior claro pois que eu cá sei muito bem qual é o meu lugar, apesar de não gostar muito nem do sítio, nem das vistas, nem da inclinação, nem da renda que pago, a bem dizer de nada de nada do que me calhou na rifa, mas que hei-de eu fazer senão continuar a escrever boçalidades e trivialidades que parece ser a única coisa que tenho gosto e prazer em fazer!

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